Canadense
dá nota zero para a segurança da Estrada de Ferro Carajás
E as impressões de James Bertrand
eram, de fato, chumbo grosso para a mineradora. De cara, o canadense revelou
que teve muitas dificuldades em obter informações, chegou a pedir ajuda da
Vale, mas não teve seu pedido atendido.
O que a Vale temia, aconteceu. A mineradora,
através de seus advogados, tentou silenciar, através da Justiça, o engenheiro
ferroviário canadense James Bertrand para que ele não apresentasse o relatório
de sua avaliação do sistema de segurança da Estrada de Ferro Carajás (EFC)
durante a audiência pública promovida pelo Ministério Público Estadual do Pará
na última quarta-feira, 25, para discutir o fenômeno “Meninos do Trem”. Mas a
Justiça deu de ombros para a Vale e mandou tocar o trem, ou seja, que o relatório
fosse apresentado.
Como parte do relatório, ele fez detalhamentos e
orientações sobre fatos estranhos que identificou, o funcionamento da ferrovia,
como a expansão da EFC pode afetar as comunidades, a necessidade das agências
federais e governo trabalharem juntos para minimizarem os impactos.
Em relação ao Plano de Segurança que foi sugerido
na mesma audiência por uma empresa contratada pela Vale, James o reprovou e
explicou que o documento deveria apresentar inicialmente, como se dá o acesso
das ferrovias, e o relatório deveria apresentar claramente os locais em que os
adolescentes estavam subindo nos trens e se havia registro de acidentes.
Na opinião dele, o relatório não fez isso, e havia
poucos detalhes, sem nenhuma menção de acidentes. O segundo requerimento era
que fossem apresentadas medidas de prevenção de acidentes e desenvolvimento de
mecanismos para prevenir atropelamentos. Para isso, o relatório demonstrou que
as locomotivas remotas deveriam ser trancadas, mas não informou nada quanto a
impedir atropelamentos.
O relatório do plano, também, deveria demonstrar a
possibilidade de os vagões serem cobertos, não tendo citado nada sobre isso. Em
relação ao monitoramento mais amplo da Estrada de Ferro, o relatório deveria
sugerir ampliar o sistema de iluminação ao longo da ferrovia, o que também não
foi proposto pela consultoria contratada pela Vale.
Bertrand também apontou o dedo para a ausência de
um plano para instalação de câmeras nos pontos de acesso e de parada, tendo
isso ficado limitado aos locais em que as câmeras já haviam sido instaladas.
“Não entendo como a ANTT não se preocupa em fiscalizar a segurança das
ferrovias. A ocorrência de trens parando ou passando devagar por comunidades, e
crianças embarcando irregularmente ou sendo atropeladas é um problema e deveria
ser fiscalizada pela agência”.
O relatório deveria descrever o relacionamento da
Vale com a segurança pública, não tendo demonstrado nada nesse sentido. O
relatório deveria mostrar o relacionamento da Vale com agências de trabalho voltadas
à infância e juventude, mas não trouxe dados nesse sentido. “A Vale citou mais
os riscos para a empresa que os riscos para crianças e adolescentes”, disse o
engenheiro ferroviário.
Outra conclusão do canadense é que o relatório
aponta que as causas do fenômeno “Meninos do Trem” são econômicas e sociais,
das quais ele também discorda. Na sua visão, a Vale não está disposta a sanar o
problema e pondera que está havendo falta de vontade da mineradora em adotar medidas
para identifiquem crianças nos vagões, bem como coibir o embarque.
Vale tem tecnologia para evitar embarque
clandestino
Ao abordar o tema “administração da ferrovia”,
James Bertrand avaliou que as decisões são tomadas por gerências em camadas, e
não localmente. E esses gerentes estão desconectados dos problemas locais. Isso
dificulta a adoção de medidas, sendo a resposta sempre morosa. Ele não duvida
que os funcionários da Vale tenham capacidade de lidar com os problemas e
eliminá-los, mas teriam que ser direcionados para isso e receber apoio. James
analisou projeto feito pelo departamento de segurança da Vale, concluído em
2012. Estranhamente, disse pouquíssimos funcionários da Vale entrevistados por
ele sabiam de sua existência. Para ele, o plano de segurança da mineradora deveria
identificar a raiz do problema das crianças e adolescentes embarcando nos seus
trens. “A causa principal é que os trens se movem muito devagar e não há
seguranças para verificar crianças subindo nos vagões. Isso está causando
animosidade entre órgãos. E a Vale está permitindo que esse embarque ilegal
ocorra”, opinou.
Em relação ao acesso à ferrovia e aos trens, ele
recomenda que a Vale envie equipe de funcionários e que estes simplesmente
sigam as determinações da ordem judicial que há em Santa Luzia-MA. De acordo com
sua pesquisa, os funcionários da Vale já estão cientes do problema, mas não há
documento formal. Quanto às câmeras, sugere torre de filmagens que possibilitem
filmagem superior dos vagões em postos estratégicos da ferrovia e recomenda
também que a Vale continue realizando o monitoramento das atividades com
confecção de relatórios, sempre supervisionada pela ANTT. “A Vale possui
tecnologia para identificar temperatura de uma roda do trem a qualquer momento
da viagem, portanto, tem tecnologia para prevenir também embarque clandestino”,
conclui.
Reportagem: Ulisses
Pompeu Foto: Arquivo
Portal Pebinha de Açucar
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